Daniel percebeu o vidro
quebrado, levantou-se rapidamente da cama e saiu da casa a tempo de ver
Patrícia virar a esquina, a fachada de sua casa estava toda pichada de vermelho:
“GAY, GAY, GAY, GAY, GAY! VEADO
ENRUSTIDO QUE FINGE QUE É HOMEM. BOIOLA!”.
Não pensou duas vezes em
seguir Patrícia para tirar-lhe explicações. Quando conseguiu alcançá-la,
agarrou-a pelo braço violentamente.
_ O que você quer? Está
doida? – disse severo, mas em baixo tom.
_
Me solta! Me solta antes que eu grite. Isso para você aprender que eu não sou
mulher que se traia. Muito menos com um homem. – disse olhando-o nos olhos. –
Agora me solta.
Ele viu algumas pessoas
olhando-os com suspeita, a soltou.
_ Sabe o que me surpreende é
que você era tão machão. Fico surpresa como tamanha mudança.
_ Deixa de ser cínica. O que
é que você quer com tudo isso? Está louca?
_ Estou sim! Quero vingança,
quero escândalo, quero tudo. E outra, você que não se atreva a encostar perto
do seu amiguinho.
Dessa vez ela quem pegava
no braço dele e apertava com força.
_ O que é isso? Vai me
impedir de ter vida social agora?
_ Você entendeu o que eu
quis dizer.
_ Desse jeito você vai furar
meu braço com suas unhas.
_ Está avisado.
_ Se não...
Ela soltou do braço dele e
tomou uma atitude de mocinha delicada.
_ Não sei, amor. Pichar sua
parede é uma coisa, qualquer um que te odeie faz isso, mas quando sua ex
comenta que você – aproximou do ouvido para sussurrar – chamou por um homem na
cama. Imagina? Se eu fosse você eu ficava esperto. Te amo, bebê! Tchauzinho!
Sorriu para ele e virou-se
para outra direção. Ele não percebeu que ela se afastou chorando.
“Você será meu de volta! Só
meu e de mais ninguém.” – ela pensou.
- A história de Patrícia. -
_ Você tem visita? – disse a
mulher.
_ Visita, uma hora dessas?
Quem poderia... – se espantou, nunca esperaria vê-lo ali no sofá de sua casa já
de noite – Daniel?
Ele se levantou para
cumprimentá-la.
_ Oi Patrícia, tudo bem?
_ Tudo bem, sim! E você? O
que faz aqui uma hora dessas? – via que ele estava nervoso, parecia querer lhe
contar alguma coisa importante.
_ Eu estava lá em casa, e
estava pensando. Pensei muito, esses dias.
_ O que está acontecendo,
pode contar comigo!
_ Não sei se você vai
querer... Afinal, eu...
_ Fala! – estava sentado um
de frente para o outro.
Ele a olhou nos olhos,
segurou em suas mãos, beijou-as e fez a pergunta que ela havia esperado desde o
momento que o conheceu:
_ Quer namorar comigo? –
começou chover.
_ Oi? – ela havia entendido
muito bem, mas queria ouvir mais uma vez.
_ Por favor, não me faça
repetir. Foi difícil chegar aqui. – fez-se de difícil, sabia que esse charme
era infalível.
_ É que... Eu não...
_ Não quer? – interrompeu
estrategicamente com um olhar desesperançoso.
_ Não, não é isso! Eu quero,
mas nunca imaginei...
_ Então você me aceita como
namorado?
_ Se aceito? – sorriu
radiante – Claro que sim! Nossa! Era tudo que eu mais queria desde que te
conheci.
_ Nunca soube que você gostava
assim de mim, se eu soubesse...- mentiu. – Então, vou falar com sua mãe.
_ Não! Não precisa! Não
precisa falar com ela. Ela é tranqüila quanto a isso.
_ Então, tudo bem.
Ficaram em silêncio, não
tinham assunto.
_ Bem, então já vou indo.
_ Já?
_ É, não tem ninguém lá em
casa. – nunca tinha ligado para isso antes – E não gosto de deixar a casa sem
ninguém. O Thiago estava lá, mas teve que ir embora.
_ Fiquei sabendo que ele foi
assaltado no festival.
Daniel tentou disfarçar.
_ É, foi sim, mas graças a
Deus não foi nada grave e não aconteceu nada demais. Como ficou sabendo?
_O pessoal comentou por
alto. Acho que algum conhecido viu a movimentação e se certificou do que se
tratava.
_ Ah! Ele estava lá em casa,
mas teve que ir embora. A avó dele está um pouco doente. E a gente se
desentendeu. É isso.
_ Nossa! Por quê? Vocês não
se desgrudam, são amigos desde pequenos.
_ Ele fez umas escolhas
erradas e eu não aceitei. Então ele decidiu seguir o caminho dele.
_ Tomara que vocês voltem a
conversar, essas amizades de toda vida tem dessas coisas, às vezes precisam de
um tempo para voltar mais fortes.
Daniel se lembrou da
discussão com o amigo.
_ Não sei se voltamos não,
enfim... Tenho mesmo que ir!
Levantou-se para sair e
quando ia cruzando a porta, ela falou:
_ Ei! Não está esquecendo-se
de nada?
Ele apalpou os bolsos,
verificando-os.
_ Não! Acho que não!
Ela avançou sobre ele e
deu-lhe um beijo.
_ Ah! Era isso! É... Esqueci
de tão nervoso! Então, agora eu vou.
Saiu com as mãos nos bolsos.
_ Tchau amor!
Ele, assim que entrou no
carro e partiu, respirou fundo.
_ Aff! Agora tenho que
agüentar mais essa.
Patrícia fechava a porta
atrás de si, e não se agüentava se emoção. Daniel acabara de sair de sua casa
depois de um pedido de namoro. Começou a pular de alegria. Não se continha.
Estava muito feliz, se morresse, morreria sorrindo.
_ O que foi menina? Está
louca? – disse a mãe entrando.
_ Sim! Estou, estou louca de
amor!
_ O que o menino queria?
_ Ele simplesmente me pediu
em namoro! Dá para acreditar?
_ E por que ele não veio
conversar comigo?
_ Eu disse que a senhora não
ligaria.
_ Eu ligo!
_ Liga nada! Nem presta
atenção direito em mim e quando... – viu que sua mãe havia deixado a sala. –
Nada! Vai estragar minha felicidade.
Subiu para o quarto colocou
uma música preferida e pôs-se a dançar. Era uma verdadeira apaixonada. Entrou
na internet, mudou o status de relacionamento para “namorando e muito feliz”.
Mal sabia que tudo não
passava de fachada para ele.
Todo mundo se surpreendeu
quando ficou sabendo da notícia. Patrícia e Daniel estavam namorando.
_ Ficou sabendo?
_ Daniel está namorando a
Patrícia.
Era o que se ouvia na
escola.
_ Eu sabia que um dia ela ia
conseguir pegá-lo, ela não sossegava nunca, sempre em cima dele. Faça bom proveito.
– disse Roberta como quem não quisesse nada.
_ Pois é! E dizem por aí que
ele não gosta dela.
_ Nunca gostou, sei disso! –
confirmou Thiago
_ E até a trata mal de vez
enquando. – continuou Flávia.
_ Gente, fiquei sabendo que
o Daniel maltrata a Patrícia, como namoram assim? – disse alguém que ouviu
Flávia comentar.
_ Ela deve gostar dele
demais.
_ O namoro é novo e já está
assim?
_ Sei lá, esse povo às vezes
namoram por conveniência.
Os boatos eram fortes e
movimentavam a escola. Ela gostava, independente do que falavam, se era ou não
verdade, queria mesmo era que falassem.
O namoro foi bem esquisito.
Ele não a tratava bem. Não parecia aquele rapaz que foi em sua casa pedi-la em
namoro, mas suportava, era o jeito dele de demonstrar que a amava.
Quando ia a casa dele,
perdia para o computador. Ele não saia da frente da máquina para nada. Só para
ir ao banheiro e à cozinha. Ela ficava lá, admirando-o e pensando numa maneira
de conquistar sua atenção. Ela se bastava com sua contemplação. Ficar observando
suas táticas de jogos e seu jeito de xingar quando o desempenho caia era bom,
mas a rotina se tornou enfadonha.
Do que adiantava ter só o
título e não saboreá-lo de verdade. Percebeu que não era namorada de verdade.
_ Vamos dar um passeio na praça?
_ Não, não! Estou muito
cansado. Vamos ficar aqui mesmo!
Um dia ela decidiu ser mais
firme.
_ Mas você nunca quer sair.
Só ficamos aqui neste quarto sem fazer nada!
Sem olhá-la, disse:
_ Não estou te impedindo.
Então ela ia para sala e
assistia alguns episódios de séries. Estava triste, pensava em tudo para poder
aproveitar mais do seu namorado, mas ele nem sequer se movia. Nem quando eles
haviam ficado ele era assim.
Foi um namoro infeliz, mas
ela o amava.
Quando descobriu que o
namorado havia brigado com o amigo porque ele era gay, pensou que poderia
substituí-lo. Sabia da importância que aquele amigo tinha, mas agora era a vez
dela. Não quis comentar nada, afinal, não era de seu interesse, queria apenas
que ele a olhasse.
A gota d’água foi ouvi-lo
chamar por ele na hora do sexo. Que decepção. O amor foi esquecido quando o
ódio tomou lugar. Havia feito de tudo para agradá-lo, mas no final das contas
trocada por outro homem. Por que Roberta pôde tê-lo plenamente e ela não? O que
tinha melhor que ela? Eram os pensamentos que corriam em sua cabeça que agora
doente caçava aprisionar com laços mortais o homem que amava.
_ E agora? Olha só o tamanho
dessa pichação? Como ela conseguiu? – Daniel olhava a parede, enquanto discava.
– Valter, é o Daniel, tudo bem? Picharam a parede daqui de casa, passa na loja
de tintas e na vidraçaria porque quebraram também minha janela e vem consertar
isso antes que minha mãe chegue e veja isso aqui. Ela ficaria uma fera.
Entrou para casa sem dar importância para a
pichação. Entrou no quarto, olhou o vidro quebrado, sentou-se na cama. Sentiu
falta do amigo, resolveu ligar para saber como estavam as coisas. Ninguém
atendia. Olhou descrente para o telefone, isso era raro acontecer, ele sempre
estava lá, do outro lado da linha.
Agora não. Não havia
ninguém.
Quanto mais os dias passavam
mais sozinho se sentia. Ele nunca mais atendeu ao telefone.
“Será que aconteceu alguma
coisa? – pensava – Talvez só não tenha mais tempo... para mim”.
Continua...
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