quarta-feira, 5 de setembro de 2012

20| Uma Chamada



                    _ Ai, lá em casa...
                    Era comum escutar isso enquanto andava pela rua. Quando acontecia, sorria sem querer. Não se sabe se era o jeito de caminhar, ou quem sabe o jeito como olhava para as pessoas. Os passos firmes seguiam retos pela rua.
                    _ Minha nossa! Onde está suas asas, meu anjo? – ouviu de alguém mais atirado.
                    _ Deixei em casa. – e sorria mais.
                    Gostava disso, mas tudo com decência. Achava engraçado como o mundo havia mudado, as pessoas diziam coisas muito engraçadas para chamar sua atenção. Os olhares significativos eram o que mais via.
                    _ Como você aguenta?
                    _ É normal. E olha que a cidade é pequena.
                    _ Gentileza, segurar meu braço porque quero chegar com você inteiro lá em casa.
                    _ Está bem.
                    Ricardo estava sentado no sofá assistindo um documentário quando Roberta e Thiago chegaram.
                    _ Olá! – disse Roberta – Meu amor mais lindo, cheguei!
                    _ Oi, minha flor! – deu um beijo, e virou para cumprimentar o visitante – Chega mais Thiago! Tudo bem?
                    _ Oi Ricardo! Tudo bem, sim! E com você?
                    _ Por aqui tudo bem tranqüilo, trouxe os filmes?
                    _ Sim! Estão aqui na bolsa, não sei se vocês já assistiram alguns, mas eu trouxe uns também que não assisti, aí podemos vê-los juntos em igualdade.
                    _ Ok. Passa aí!
                    Enquanto Thiago despejava os vídeos sobre o sofá, a porta se abria e o José e a Flávia entravam na sala.
                    _ Cheguei linda! E meu lindo pretinho chegou junto comigo.
                    _ Sempre arrasando. – disse Roberta que foi abraçar a amiga e José se juntando aos meninos para ver os filmes. – As meninas na cozinha para preparar os comes e bebes e vocês escolham um filme bom aí, senão eu troco.
                    Partiram para a cozinha. Os meninos ficaram na sala, numa dúvida cruel com relação ao que ver. Já tinham se encontrado algumas vezes. Essa era mais uma sessão de cinema entre eles, isso virou rotina quando descobriram a videoteca que o Thiago tinha em casa e por isso era o responsável levar os filmes e arrumar a aparelhagem de som e de vídeo, para que pudessem apreciar melhor.
                    _ Thiago me perdoe se eu for indelicado, mas eu queria saber se encontraram os caras que te assaltaram? Eles te dão noticias de como estão as investigações? – perguntou Ricardo.
                    Ele se sentia um pouco incômodo de falar sobre isso, eram péssimas lembranças, mas com os amigos não tinha problema.
                    _ Ainda não Ricardo. Fizeram o retrato falado a partir do que descrevi, e sabem quem são, mas ainda não conseguiram pegar os bandidos. Eles já têm passagem e são procurados. Sempre que as investigações avançam, eles me falam.
                    _ Estamos aqui torcendo para dar tudo certo. Eles têm que pegar esses bandidos. – disse José.
                    _ Vão pegar, sim! Tenho certeza! Deixa-me ver o que as meninas estão preparando. – levantando-se e caminhando até a cozinha.
                    _ Que tanto de comida é essa, gente?
                    _ Meu filho, o povo come e não é pouco, é muito mesmo!
                    _ As meninas, eu estou ficando sem graça. – disse Thiago como se sentisse deslocado.
                    _ Por quê? – perguntou Roberta preocupada. – O que foi?
                    _ Eu estou que nem devoto. Queimando vela demais.
                    As meninas caíram na gargalhada.
                    _ Ô gente, que dó! – Flávia ria - Queima vela porque quer, tem um tanto de gente se oferecendo e você aí fingindo que nem vê.
                    _ Não se preocupe, você não vai queimar vela sozinho. – Roberta falou rindo.
                    Bateram na porta.
                    _ Vai lá atender. – disse Flávia antes de gritar – o Thiago vai atender!
                    Isso fez com que o José e o Ricardo não se movessem do lugar, acharam o máximo porque estavam mesmo com preguiça de ir até a porta. Ensaiavam como pedir uns filmes emprestados ao Thiago que foi abrí-la.
                    Quem vinha chegando, ao vê-lo, o olhou de baixo para cima e fez como se estivesse voltando porque bateu na porta errada, mas não, foi apenas conferir se era mesmo aquela casa. Ele também reparou. Fez cara de desentendido.
                    _ Oi! – disse Thiago rindo da cena.
                    _ É a casa da Roberta, não é?
                    _ Quem é, Thiago? – a voz da Flávia surgiu do nada, gritava de lá de dentro da cozinha.
                    _ Sim! É essa mesma. – ele sorriu - Você é?
                    _ Sou Mariah. – sorriu a moça de cabelos longos, um pouco menor que ele de olhos amendoados, tinha lábios brilhosos por causa do gloss de morango que havia passado antes de abrirem a porta, em seu pescoço uma discreta corrente que segurava uma pedrinha verde.
                    _ Mariah? De Mariah Carey? A cantora? - brincou
                    Ela sorrindo porque ele sorria para ela, explicou:
                    _ Não! Na realidade se pronuncia “Maria” mesmo, mas as meninas descobriram que tem um “h” no final e me chamam como se fosse igual ao da cantora, me acostumei. Atendo pelos dois. E também pelo meu telefone.
                    Thiago fez uma expressão de “minha nossa!”, e disse:
                    _ Está bem, vou te chamar de Maria, Maria mesmo, pode ser?
                    _ Claro que pode. Me chamando, meu filho, é o que importa. – Mariah riu – Estou brincando, viu! Não sou tão atirada assim não. É só para quebrar o gelo.
                    _ Eu sei. – consentindo – meu nome é Thiago. Prazer.
                    _ Prazer todo meu Thiago, com “TH”?
                    _ Sim! T-H-I-A-G-O! Quase tradicional.
                    _ Adoro!
                    Enquanto um olhava para cara do outro sorrindo, a Roberta viu que conversavam na porta mesmo, então chamou a Flávia para ver.
                    _ Vocês não querem entrar, para ficarem mais à vontade, tem um sofá aqui. Thiago, eu não te ensinei assim.
                    Todos da sala riam. Thiago ficou sem graça. Mariah olhou para as meninas com cara de “tudo estava bem, obrigada!”.
                    _ Desculpa! Entra aí. – disse ele.
                    _ Não se preocupe Thiago. Esse povo é besta demais. – disse entrando e abraçando as meninas e falando com os meninos. – Seus bobos. E aí povo, como estão todos? Cadê tia?
                    _ Minha mãe foi na casa de minha avó. Estamos bem demais, e você “Hero”? – disse Roberta se dirigindo a amiga com o nome de uma música da cantora.
                    _ Ei! – interrompeu Flávia – Não comece a chamar “My all” assim. Ela gosta de ser tratada pelo nome, não é, “When Christmas comes”.
                    _ Nossa! – disse Mariah.
                    _ Música nova. – disse Flávia rindo – parei Mariah isso me cansa rápido.
                    As meninas foram para cozinha de novo. Bateram mais uma vez na porta.
                    _ Vai lá porteiro oficial! – gritou Flávia.
                    Thiago nem tinha sentado e ao abrir a porta viu um garoto talvez mais novo que ele abaixado arrumando o tênis. Com alguns cachos louros escapando por baixo do boné aba reta e um jeito meio largado se levantou para falar com quem tinha aberto a porta, quando Thiago encarou que viu olhos bem diferentes do comum, como se o ponto menor mais negro dos olhos tivesse caído sobre o azul Royal espalhando um tom amarelo em sua volta, semelhante ao sol.
                    “Que olhos legais!” – Thiago pensou.
                    Como o rapaz não esperava ver quem viu, se atrapalhou quando foi falar.
                    _ É...A... A... Flávia. A Flávia está aí?
                    _ Está sim, você é?
                    _ Sou Ângelo, o irmão dela. Pode chamá-la, por favor.
                    _ Claro! – Thiago foi à cozinha e voltou trazendo a Flávia.
                    _ O que é menino? Tem cara e nome de anjo, mas é o diabo, viu! Não acredita nessa cara linda dele, não! Vê se sua carteira ainda está no bolso, Thiago.
                    Instintivamente, Thiago levou as mãos aos bolsos. E Flávia e Ângelo riam.
                    _ Vim assistir ao filme! – disse ele.
                    _ Você me chamou para isso. Entra menino. Nossa, que lerdo! Thiago, esse é o Ângelo, meu irmão menor.
                    Thiago ia apertar a mão dele num gesto tradicional de cumprimento, mas o garoto bateu e fechou a mão, num cumprimento moderno.
                    “Aff, estou ficando velho!” – Thiago pensou.
                    Tudo ficou pronto para uma tarde muito agradável de cinema em casa.
                    _ Todos esses filmes são seus? – perguntou Ângelo
                    _ Sim! E tem mais lá em casa!
                    _ Uau! Todos originais. Deve ter custado uma nota preta.
                    _ Sim! Custaram mesmo. Os DVDs originais são bem caros, por isso tenho muito cuidado com eles. Além da qualidade que possuem não estragam gradativamente meus aparelhos que também não foram baratos.                   
                    Entre um filme e outro, Mariah foi à cozinha e perguntou às meninas:
                    _ Gente, o que é aquilo naquela sala, meu pai!
                    _ O que menina? – Flávia fingindo que não sabia o que era.
                    _ Aquele gato, deus da beleza sentado ali...
                    _ Ah! É o José, boba, pensei que conhecia meu namorado.
                    Riram todas.
                    _ É um amigo nosso desde pequeno, tinha um tempo sumido daqui de casa, mas agora está de volta.
                    _ Nunca tinha visto por aqui. Vou investir, hein! Está disponível?
                    _ Se conseguir, minha filha você tira a sorte grande! – disse Flávia.
                    _ Fechado.
                    Durante um filme de comédia, Thiago percebia os olhares da Mariah para ele, então um celular tocou. O do Thiago.
                    _ Você não viu o aviso de “Desligue seu celular, pois o filme vai começar”, não? – Flávia brincou.
                    Thiago levantou rapidinho e foi atender na cozinha.
                    _Thiago!
                    _ Boa tarde! Você é o Thiago Allexander Villani? – disse uma voz feminina aveludada do outro lado.
                    _ Sim! Quem fala?
                    _ Só um momento, por gentileza, Thiago.
                    Thiago esperou um pouco, ouvindo aquela uma música de fundo que foi cortada por outra voz, agora masculina.
                    _ Olá, Thiago!
                    _ Oi, quem fala, por favor!
                    _ Aqui é o Marlon Velásquez, tudo bem?
                    _ Tudo bem, Marlon! – Thiago não tinha a mínima idéia de quem estava falando com ele, mas tinha a ligeira sensação que já tinha ouvido falar desse nome. – Então, em que posso ajudar?
                    _ É o seguinte, eu tenho em minha mesa algumas fotos de um book que você enviou para nós da X Models Agency. Eu gostei de você, mas achei as fotos um pouco amadoras, pelo que vejo você fala e mora no interior. Não é isso?
                    _ É... É... É sim, senhor! – Thiago não acreditava.
                    _ Você é gago? – Marlon brincou.
                    _ Não. Não sou. – tentou se controlar.
                    _ Ah sim! Eu gostei mesmo de você e pensei em convidá-lo para vir aqui na agência fazer umas fotos profissionais para conferirmos o resultado e quem sabe iniciar uma promissora carreira de modelo, o que você acha?
                    Thiago não conseguia falar.
                    _ Thiago? – o Marlon imaginava o que estava acontecendo – Posso considerar isso como um sim?
                    _ Pode! Sim! Claro, com certeza! Vou sim! – não disfarçou o entusiasmo e a alegria violenta que o acometeu.
                    _ Está bem. Te espero aqui então. – disse despedindo-se - Ah! Não desligue, porque a Mônica, a secretária, vai te dar uns conselhos. Grande abraço.
                    _ Obrigado Marlon! Obrigado mesmo!
                    _ Não tem o que agradecer. – a música da agência voltou a tocar.
                    _ Thiago? – disse Mônica
                    _ Oi Mônica! – a voz de Thiago sorria – Tudo bem?
                    _ Gostou da notícia?
                    _ E como! Amei demais, nem acredito ainda.
                    _ Acredite, pois é verdade. Eu preciso te passar algumas informações referentes a sua chegada aqui na agência. Seu vôo está marcado para as 7h da segunda-feira, no aeroporto um rapaz vai te esperar com uma plaqueta com seu nome e aí ele o trará até nós, ok?
                    Mônica passou todas as informações necessárias para que Thiago não se perdesse e chegasse seguro.
                    _ Ok, Mônica! Obrigado! Muito obrigado!
_ Por nada! Até mais!
Thiago desligou o celular. Uma euforia incontrolável o invadia. Os sentimentos mais felizes tinham se multiplicado.
_ Não acredito que posso virar modelo... – disse sem acreditar.

Continua...
© Copyright Mailan Silveira 2011.Todos os direitos reservados.

Nenhum comentário: