_ Traído! –
esbravejou Daniel
_ Na
realidade, trocado! – disse Thiago
_ Você não
está ajudando...
_ Encare os
fatos, Daniel. Ela te trocou e ponto. Agora, parte para outra. – dizia o amigo,
quando viu Daniel o encurralar.
_ De maneira
alguma vou deixar que eles fiquem juntos. Está me entendendo? – a raiva o
deixava vermelho.
_ Então me
diga para quê, com que razão você terminou com ela? Não foi você mesmo quem
inventou aquilo tudo para acabar com o namoro?
Aquilo ainda
doía na lembrança. Como se enganou tão fácil consigo mesmo. Estava enjoado do
relacionamento, parecia que nunca mais teria liberdade. Temia casar. Pareceu
que Thiago lia os pensamentos, afinal eram amigos desde pequenos e se conheciam
como ninguém.
_ Medo de
casar? Um namoro de quatro anos e você tinha medo de casar? Para mim, já era um
casamento.
_ Quatro anos
passaram muito rápido. E se eu tivesse casado não poderia ter terminado daquele
jeito. Sou jovem, não posso casar agora.
_ Pelo que sei
a Roberta nunca te pressionou para casar. Nunca a vi falando nada.
_ Para você
ela nunca falou, mas sempre ficava vendo coisas de casa e de bebês. Isso me
assustou.
Thiago, sem
entender muito os argumentos do amigo, ria. Óbvio, que era coisa de mulher.
_ Nunca te
entendi, você é meio doido, mas estamos juntos! Já conheço essas suas vontades
repentinas do nada.
Daniel o mirou
com um olhar agradecido, e foi retribuído carinhosamente. Era um amigo para
toda vida. Sempre compartilharam coisas e nada escondiam um do outro. Irmãos?
Quase.
Na casa do
Thiago, em cima da estante, abaixo de uma fila de livros clássicos, tinha uma
montagem com várias fotos dos dois em vários momentos. Um presente de fim de
ano que Thiago fez. Dessa montagem só existia mais uma, que estava na casa de
Daniel. Ao lado havia uma foto com os pais de Thiago, que haviam morrido num
acidente de carro quando ele tinha apenas cinco anos.
Desde o
acidente, era a avó quem cuidava dele, mas no último final de semana, ela caiu
na cozinha e fraturou a pélvis e teve que passar vários dias no hospital. Thiago
não saia de lá neste período, mas assim que retornou, ficou sabendo pelo Daniel
tudo que aconteceu.
Ele se
interessava na história porque queria ver a felicidade do amigo, mas já tinha
se cansado de todo esse joguinho do Daniel.
_ Acho que
você devia parar de se preocupar com a Roberta. Ela não está preocupada com sua
vida, e você fica aí como um idiota, gastando sua vida, ao invés de aproveitá-la...
- disse sabendo que o amigo escutaria, mas não se importaria com o que estava
dizendo – Com quem gosta de você de verdade.
_ Thiago! -
Daniel arregalou os olhos – Preciso do seu incentivo e não da sua reprovação.
_ Aqui você
sabe que não tem um motivador para coisas erradas. Tem um amigo que diz o que
tem que ser dito. Se você vacilou quando terminou com a garota e vê que não dá
para voltar, parte para outra. Moço, você é mais que isso!
_ Uau! Depois
de um argumento desse, não posso falar mais nada. – disse levantando as mãos se
rendendo.
_ Dê valor mesmo
para que te valoriza! Espere aqui. – Thiago foi ao quarto da avó.
Daniel havia
percebido que seu amigo estava diferente. Mais caseiro. Bem mudado na
realidade. Não saia mais quando era convidado pelo Daniel. Parecia está
evitando alguma coisa. Como eles eram bem transparentes um com o outro, apesar
de ver que o amigo diferente, sentia que ele tinha algo que não conseguia
expressar, Daniel não quis forçá-lo contar nada. Queria que fosse ao tempo
dele. Ou também talvez fosse coisa de sua cabeça.
_ Estava na
hora do remédio. – disse Thiago voltando
_ Como está a
vó Zita?
_ Bem, graças
a Deus! Precisa de muito repouso, mas é uma ótima paciente e nunca reclama.
Está assistindo ao filme.
_ Ok. Fale com
ela que mandei um beijo e que volto aqui mais tarde para vê-la.
_ Volta mesmo?
– Thiago perguntou interessado.
_ Sim! Claro
que volto! Ultimamente você é o único que me agüenta. – Daniel disse sorrindo.
_ Que sorte a
sua! – retribuiu
_ E azar o
seu. – Daniel disse isso dando um abraço no amigo.
_ Obrigado!
Daniel
ironicamente com cara de tédio para ele.
_ Vou te dá
uma voadora. Não tem do que agradecer... Eu volto, hein!
_Vou esperar.
Daniel entrou
no carro que estava estacionado em frente à casa, buzinou e partiu.
Thiago, todo
confuso, esperou o carro desaparecer na rua.
Entrou em
casa, sentou no sofá onde a pouco o Daniel se encontrava, olhou para a
porta-retrato onde os momentos mais legais de sua vida estavam registrados.
Eram os mais legais, porque ele mesmo os havia escolhido. Se sentia sortudo por
ter um amigo que era tão solícito e prestativo. Muitos não conheciam esse
Daniel que ele conhecia.
_ Thiago! –
uma voz o chamou de algum lugar.
_ Oi, vó!
Estou aqui!
_ Oh meu
filho, me faz um favor, sabe aquele filme do gato, que ainda não assisti?
Então, coloca esse!
_ Está bem,
vó! Deixe-me ver onde está? – pôs-se a procurar o filme – Onde foi que eu pus
esse dvd? Jurava que tinha colocado aqui.
_ Daqui eu
estou vendo. Vai te morder. – ria dona Zita.
_ Ah! Está
aqui! – disse levantando as sobrancelhas, meio envergonhado por não ter
percebido o objeto tão perto.
_ O que foi,
meu neto? Você ultimamente tem estado estranho demais e bem inquieto. Você fica
todo atordoado quando o Daniel vem aqui. Está acontecendo alguma coisa?
Thiago olhou
estranhamente para dona Zita que estava deitada na cama, tentou não demonstrar
nada, nem expressão alguma.
_ Não, vó! O
que poderia está acontecendo? Nada, não é? Pelo amor de Deus!
Dona Zita era
idosa, mas o espírito dela era bem contemporâneo. Ninguém, nem mesmo o Daniel
com tantos anos de amizade, conheciam o verdadeiro Thiago. Ele parecia muito
acessível a todos, mas isso era apenas uma maquiagem. O inacessível foi sendo
vencido pela convivência.
_ Meu neto,
não é de hoje que te conheço. Te vi nascer e te conheço mais que a mim mesma.
_ Eu, hein?
Que conversa estranha, minha vó! – Thiago começou a arrumar rapidamente as
coisas sem olhar para a velha – Olha o filme aqui!
Assim que
Thiago arrumou tudo e ligou o filme, mostrando que ia sair do quarto, dona Zita
disparou:
_ É esse
“nada” entre você e Daniel que te deixa assim, não é?
Thiago estancou
diante da porta. Não sabia o que dizer, nem como reagir. Uma vontade
desesperada de sair correndo surgiu no peito, mas a mesma voz que ele ouvira
prometer nunca abandoná-lo, perguntou:
_ Não quer
conversar?
Controlou-se. Mil
pensamentos o atormentavam e os pesos de decisões que poderiam ser tomadas de
ali em diante surgiram fazendo-o não fazer nada. Estava estático.
_ Não há nada
que se envergonhar ou temer. Ainda mais de mim. Não quer mesmo conversar?
Virando,
encontrou uma mão estendida no ar, e no rosto compreensivo e disposto a ouvir,
um sorriso. Não resistiu.
_ Quero! –
disse entre lágrimas.
Continua...
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