4| Ameaçado pelo ex.

            No quarto escuro, uma murmuração abafada.

            _ Ai!- disse Daniel quando abriu os olhos ao som do despertador – Como minha cabeça está doendo! Nossa! Lembrar-me de não misturar mais nada.

Chegou ao meio-dia do dia anterior e agora precisava se levantar para ir à escola. Havia bebido demais e na realidade não se lembrava de muita coisa que tinha feito na festa que participou. Apesar da ressaca, se sentia bem por não ter que dar explicações para ninguém.

_Oi liberdade! – sorriu.

            Tomou um banho demorado e na escola encontrou-se com Thiago, seu amigo inseparável de baladas, agora que estava solteiro.

            _E aí, brow! Tudo beleza? Nossa, minha cabeça está doendo muito! – disse Daniel com a mão na cabeça

            Ao ouvir isso, Thiago riu e disse:

            _ É sempre assim, mas depois você acostuma. E a festa? Minha nossa! Essa foi a festa, viu! Peguei muita menina! – entre gargalhadas, contava vantagem – E você também, hein? Só foi tirar a coleira que o cachorrão se lambuzou...

            _ Oh! Fala baixo, terminei recentemente e o que o povo vai pensar... – meio cauteloso e olhando para os lados – Sim! Foi muito bom, quando tiver outra me avise, aí eu me preparo melhor...

            _ Ah! Você não sabe que está de volta na cidade? Não vai acertar nunca!

            _ Não faço a mínima idéia, você sabe que sou péssimo para essas coisas, fala logo!         

            _ Não sei se você vai gostar muito, mas acho que agora, nem vai ligar mais, se foi em outros tempos, até que ligaria...

            _ Fala logo, caramba!

            _ Nuestro hermano Ricardo! – o Thiago falou como se anunciasse uma grande personalidade.

            _ Quem? O Ricardo! – surpreso - Era só o que me faltava! O que ele veio fazer aqui? Só pode ter se dado mal na Espanha. É um idiota mesmo!

            _ Não, mano! Está errado! Ele voltou porque o intercâmbio acabou! Eram quatro anos.

            _ E por que não ficou por lá? Esse menino não me desce! Ele se acha demais!

_ Já está assim? E nem contei tudo...

_ Fala então... – vociferou Daniel.

_ Vai terminar os estudos aqui na escola.

_ Como você sabe disso?

_ A Patrícia me contou e eu vi na ida para casa ontem à tardinha, um casalzinho passeando na calçada às gargalhadas pra todo mundo ver...

 _ Roberta e ele? Já? É impossível que ela tenha me esquecido tão fácil assim. Namoramos há muito tempo. Não acredito...

_ É meu filho! Quase foi chifrado, se não tivesse largado antes.

Com um empurrão em Thiago, Daniel disse:

_ Deixa de ser idiota. Pode escrever que isso não vai ficar assim! Ela pode até não ficar comigo, mas com ele, ela também não fica.

_ Daniel, não te entendo! Juro que às vezes te acho muito doido. Não foi você que armou aquela palhaçada toda para cima da menina para se separar dela.

_ Não quero saber! Você viu o que aquele filho da mãe fez para me separar dela antes de viajar, e agora se ele está pensando em ficar junto dela, mas de jeito nenhum. Se não for eu, ele também não vai ser.

Thiago olhou, com uma cara desconfiada, mirando o rosto vermelho de Daniel e perguntou:

_ Me responda com sinceridade. Você ainda gosta da Roberta?

Daniel olhou para o amigo, o olhar o denunciava. O sinal tocou. Ele levantou e saiu sem responder. A última aula ia começar.

Roberta e Flávia caminhavam apressadas para a sala onde teriam a última aula.

_ Ah, gente! O destino é lindo não é mesmo? – disse rindo.

_ Flavinha! Deixe de bobagem! Nada a ver.

_ Nada a ver? Minha amiga, o destino colocou na sua mão a chance de ser feliz de novo. Te livrando daquela mala do Daniel e te dando o deus grego do Rick!!! Mas faz assim, se você não quiser, fale com a mamãe aqui. – Flávia gargalhava.

_ Rick... Espera aí, e o José? Como fica o neguinho preferido da mamãe? – ria irônica

_ Ah, o José é meu amorzinho, mas é sério, Beta. Você era muito legal com o Daniel e fazia coisas que namorada nenhuma faria, como deixá-lo sair e não ir e outras coisas e ele era muito ciumento com você, nem te deixava sair comigo! Vê se pode?

­_ Está bem, está ótimo! Vamos entrar que estamos atrasadas.

O sol estava no ponto mais alto do céu, quando a aula terminou.

_ Ufa! Até que enfim! Não agüentava de tanto calor, esse professor nunca libera mais cedo! - Flávia secava a testa enquanto se dirigia ao bebedouro mais próximo.

_ Ô Flávia, eu estive pensando na sala. Apesar de o Daniel ter feito tudo que fez, sabe? E do Ricardo ter voltado lindo...

_ Sim! Muito lindo! – exaltou a amiga entre um gole e outro.

_ Eu ainda gosto do Daniel. Sei que ele não merece, mas acho que o que eu sinto por ele não pode e nem vai se desfazer do dia pra noite. Eu até o entendo, me viu com o Thiago.

_ Amiga, vou te falar a realidade. Hoje vi o Daniel com o Thiago para lá e para cá na escola, como se nada tivesse acontecido. É por isso que eu te digo, dá uma chance para o Ricardo! Nós duas sabemos que ele ainda é caidinho por você que sem querer até treme perto dele.

_ Os dois juntos como se nada tivesse acontecido? - disse Roberta sem graça - Acho que posso tentar não é mesmo?

_ Já é um bom começo!

Seguiram para van que as esperava.

Ao chegar em casa, Roberta escuta um música que vinha da casa da frente:

“Para tu amor yo tengo todo

Yo tengo todo y lo que no tengo también

Lo conseguiré

Para tu amor que es mí tesoro

Tengo mí vida toda entera a tus pies.”

            Roberta sorriu ao perceber que nem lembrava que o amigo cantava tão bem . O Ricardo estava tão empolgado cantando dentro de casa, que nem imaginava que quem estava na rua o ouvia claramente, ou sabia?

            Enquanto ela entrava em casa, ele, do outro lado, saiu e a olhava com ternura. Sabia quando ela chegava em casa, e às vezes a olhava entrar. Estava tão perdido admirando o desfilar da amada que nem viu Daniel se aproximar dele.

            _ E aí, Ricardo!

            _ Daniel! – controlou a voz para não parecer surpreso – Tudo bem?

            _ Estava, mas vai melhorar! Como você está? – fingindo certo interesse.

            _ Bem! E você?

            _ Melhor, impossível!- olhou para casa da Roberta – E aí? Por que você voltou da Espanha? Não conseguiu sucesso lá?

            _ Oi? Porque esse interesse todo, Daniel? Você nunca quis ser meu amigo? Agora vem aqui e me faz esse interrogatório todo? Que tal irmos direto ao assunto! – disse seco – O que você quer?

            _ Gostei! Se afaste da Roberta!

            _ Pelo que sei, ela não é mais nada sua!

            _ Mas...

            _ E você quem terminou com ela, estou mentindo? – Ricardo interrompeu tranqüilo e firme.

_ Demos um tempo. – disse Daniel altivo – E isso não significa que você pode se oferecer para ela. Ela ainda me ama e parece que vou ter que te lembrar de quem ela escolheu.

_ Isso é passado. – disse meio afetado pela lembrança desagradável.

_ É o que veremos. Deixei meu aviso: SE AFASTE DELA!

Dando as costas, Daniel foi saindo.

_ Ou? – Ricardo perguntou provocando

Parado e sem virar, disse:

_ Sofra sozinho, as consequências.

_ Me ameaçando? – disse sério.

_ Não! O que é isso? Jamais! – sorriu ironicamente - Apenas constatando um fato, afinal não sabemos o que pode nos acontecer a qualquer momento, não é?

Daniel se afastou, mas a tensão ficou no ar. Ricardo achou incrível que o rival fosse capaz de ir a sua casa fazer uma cena daquela.

_ A vida é cheia de surpresas. Ninguém disse que seria fácil. – disse Ricardo entrando em casa.

                                                           Continua...

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