A noite
estava linda. O céu estrelado dava a certeza de que o festival seria um grande
sucesso. Havia uma multidão do lado de fora do espaço dos espetáculos, carros
passavam devagar por causa da multidão que se espremia para ter acesso às
entradas. Não foi diferente para Ricardo, José e Daniel que procuravam
desesperadamente vagas. Por um acaso, os dois primeiros estacionaram,
praticamente, juntos bem adiante, e Daniel seguiu para um espaço bem mais na
frente, ao passar conseguiu identificar os garotos estacionando. Marcou
mentalmente a posição. O estacionamento era muito grande e cercado pelo matagal
que envolvia o espaço, já que era afastado da cidade.
Os casais estavam planejando um
método para poder entrar, ver os melhores lugares, já que apesar da multidão
que cercava o local, temiam ficar em lugares desfavoráveis. Não demorou muito
para que Daniel e Thiago passassem pelo grupo. Roberta, Flávia olharam
disfarçadamente para que Ricardo e José não percebessem. Os dois rapazes não
olharam para elas.
O festival de inverno aconteceu
numa área gigantesca estruturada intencionalmente par este fim, realizavam –se
naquele local, espetáculos de grande porte. Essa era a vigésima sétima edição
do festival que era reconhecido nacionalmente e atraía multidões, pois era
realizado um só dia. A fachada externa se perdia de vista tanto para direita
como para a esquerda. Um letreiro luminoso brilhava bem acima de todos com o
nome do local.
Enfrentar a fila era desafio
para Jó. Depois de vários minutos esperando, chegaram na entrada. Que havia um
dispositivo luz negra. Como foram orientados no ato da compra, exporam a parte
de cima da mão esquerda sob a luz e como num passe de mágica surgiu sobre a
pele em luz fluorescente o símbolo da festa e do local e data do evento. Após a
constatação da veracidade das marcas passaram por detector de metais e uma
rigorosa revista. Então, entraram.
O espaço interno era
impressionante, a cobertura era semelhante à de um campo de futebol. Luzes e
lasers para todos os lados. As sinalizações eram grandes e claras para que tudo
corresse muito bem. Era a primeira vez que estavam indo e ficaram todos
deslumbrados com a estrutura do local. O complexo ao lado direito era
exclusivamente para alimentação, o da frente era para apresentações, entradas
sobre tapetes vermelhos e à esquerda camarotes. Era para onde todos iriam.
O
palco ovalado permitia que todos visualizassem as cenas que ali ocorriam, uma
passarela de dez metros cortava a multidão para fazê-los delirar com um contato
mais direto com o seu artista preferido.
Estavam todos conversando, fotografando, esperando
o início dos espetáculos. De um momento para outro tudo ficou escuro, os gritos
invadiram o ambiente, só se via flashs e luzes minúsculas de câmeras e
celulares. Um som baixo começou a ganhar volume, os corações pulsavam seguindo
seu ritmo, perceberam que era o som de batidas de coração que começaram a serem
acompanhados de sinais sonoros compassados, seguido de um sinal contínuo, o
coração parou de bater. Letras enormes apareceram no telão: DANCE OU
MORRA.
A sincronia das luzes e seus
efeitos fizeram a multidão vibrar ao passo de uma batida eletrônica. A abertura
do festival foi esplêndida. Efeitos de áudio e vídeo encantaram todos os
convidados. O espaço dos camarotes era muito grande, mas tinha muita gente com
uma visão mais privilegiada do palco os convidados dos camarotes também tinham
ao seu dispor mais variedades de bebidas e serviços exclusivos que foram muito
bem aproveitados por todos. A música estava muito boa.
Algumas bandas principais já
haviam tocado e Thiago disse a Daniel que iria ao banheiro, pois até aquele
momento não haviam se desgrudado, o amigo consentiu com a cabeça. Os banheiros
eram num nível abaixo dos camarotes.
Thiago já lavava as mãos quando
dois homens entraram no banheiro. Sem pudor algum, o miraram de cima abaixo:
_ Que delícia de “boy”!
Thiago enxugou as mãos e quando
ia saindo um o impediu:
_ Aonde vai tão cedo assim,
gatinho?
_ Com licença! Eu quero passar,
por favor!
_ Calma! – disse o mais forte.
_ O que é que vocês querem? Nem
conheço vocês...
_ Vimos você no camarote e vimos
como olha para seu amigo. Pensamos que gostaria de participar conosco de um
esquema.
Thiago não acreditava no que
ouvia.
_ É óbvio que não! Você é doido!
Quero passar, sai da frente seu horroroso.
_ Opa! Olha como fala comigo. –
empurrou Thiago que bateu no peito do outro homem que era menor que o outro,
porém mais forte que Thiago.
_ Olha aqui cara, numa boa! Não
quero confusão, só vim me divertir com meu amigo. Sério! Dá licença.
_ E nós? Nós também viemos nos
divertir. E vamos nos divertir com você.
Thiago não percebeu que um dos
homens havia sacado uma pequena faca, até o momento que a mesma encostou em seu
abdômen.
_ O que é isso? – disse
assustado.
_ Fica quieto. Não grite. Vamos
dar uma volta.
Acompanhado pelos estranhos, o
terror havia se apoderado do rapaz de sorriso fácil, e agora em seus olhos se
via o medo.
Daniel, percebendo a demora do
amigo, desceu do camarote passando por uma escadaria especial de acesso, seguiu
direto um corredor e chegou ao estacionamento.
_ É bom
aproveitar que o Thiago ainda não voltou e ir fazer o que tem que ser feito.
Furar os pneus e esvaziar um tanque, acho que vai dá um trabalho, mas vai valer
a pena.
Estava deserto
o estacionamento, afinal era uma área muito grande e onde eles haviam
estacionado não estava tão perto das entradas. Daniel andou, apressadamente,
para achar os carros e deu várias voltas. A noite já havia esfriado muito, um
relógio digital marcava 14° C.
Dois homens
fortes passaram por ele correndo em direção ao show. Daniel nem prestou
atenção, estava concentrado em achar um carro azul-petróleo, afinal, é uma cor
pouco usada.
_ Eu jurava
que tinha marcado a droga do lugar. Já andei tanto que nem está valendo a pena.
Andou muito,
atravessando carros e mais carros, ia e voltava, andava em círculo até que
parou perto da cerca que dividia o estacionamento com o lado de fora que era
mato e pôs as mãos na cintura.
“E agora?” –
pensou.
E pensou
pouco, pois foi interrompido por um barulho no mato, se afastou por medo de ser
bicho. Tentou visualizar o que tinha provocado o barulho. Forçou a vista. E desejou não tê-lo feito.
Aproximou-se
mais da cerca, porque se não estivesse concentrado, ou não ouvisse o barulho,
nem perceberia nada por ali. No escuro percebeu um corpo deitado, largado.
Levou a mão,
como se não acreditasse no que via. A primeira vontade que veio foi de correr,
e correr para o mais longe dali. Quando deu um passo para trás e virou-se.
_ Alguém me
ajude, por favor...
“Meu Deus do
céu! Eu não posso deixar essa pessoa aqui assim. Não mesmo! Está frio demais e
com certeza está precisando de ajuda”.
Respirou fundo
e procurou desesperadamente uma entrada, uma abertura, um a fenda na grade que
o permitisse passar, mais a frente havia um portão que estava escancarado, mas
de onde Daniel vinha parecia que nem existia. Deu a volta, e se aproximou da
vítima.
O estado em
que se encontrava era lamentável. A vítima estava semi- nua. O que antes eram
roupas, não passavam de trapos rasgados que se espalhavam por toda parte. O
vento frio e cortante passeava entre as arvóres.
“Deve ter sido
violentado!” – pensou Daniel vendo os panos rasgados.
_ Me ajuda...
Alguém! – dizia a voz que murmurava socorro.
Sujo e
ensangüentado, foram as primeiras coisas que Daniel viu quando conseguiu atravessar o mato que o separava
da vítima, seus olhos marejados. Tinha
se esquecido completamente do que foi fazer no estacionamento. Abaixou-se e
virou devagar o corpo quase branco cheio de arranhões e hematomas, resultados
de luta, no pescoço uma mordaça que anteriormente impedia qualquer grito ou
manifestação verbal. As mãos e os pés também estavam amarrados. Tinha medo de
machucar mais, se é que seria possível.
Quando os
olhos da vítima se encontraram com os de Daniel, choraram copiosamente.
Daniel poderia
imaginar tudo, menos aquilo. A sensação que teve foi que uma mão grossa e cheia
de calos envolvesse seu coração e começasse a esmagá-lo sem piedade.
_ Que bom que
você veio. – entre o choro dolorido, o reconhecimento de ter sido encontrado.
Daniel havia
encontrado seu amigo mais que irmão, companheiro de todas as horas. Aquele por
quem tinha um carinho muito especial, mas não demonstrava muito para não ser
tachado de gay. Afinal, demonstrar sentimentos não é coisa de homem.
Thiago estava
sujo e ensangüentado no colo do Daniel.
Havia sido
estuprado.
Continua...
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