terça-feira, 16 de outubro de 2012

44| Cabeça vazia.


                    _ Oi? – disse Thiago, depois pensou – Daniel, para de brincadeira! Você não muda nunca!
                    _ Sinceramente, não sei quem você é. – mais confuso.
                    _ E você sabe quem é você?
                    _ Claro que sei! Eu sou... Sou... Daniel! Eu me chamo Daniel.
                    _ Sei. Você sabe onde você está?
                    Olhando para os lados, não duvidou.
                    _ Num hospital, olha aqui. Não te devo satisfação, onde é que está o responsável disso aqui? – meio irritado.
                    _ Você quer dizer o médico?
                    _ Quem mais poderia ser? Espera aí, que interrogatório é esse? – disse nervoso – Pode chamá-lo, por favor, estranho?
                    _ Sim! Vou chamá-lo, mas antes, me responda uma coisa. – Thiago disse cabisbaixo.
                    _ Se for a última...
                    _ Não se lembra mesmo de mim? – disse olhando-o nos olhos – Não sabe mesmo quem sou eu?
                    Daniel viu que o rapaz tinha nos olhos a esperança de uma lembrança qualquer. Devia ser alguém muito conhecido, mas quem? O momento de silêncio que ocorreu entre a falas, foi de esforço para ele que tentava se lembrar quem seria esse rapaz, que fazia tanta questão que ele se lembrasse dele, mas nada lhe vinha à cabeça.
                    _ Você é modelo? – Daniel arriscou.
                    _ Você lembrou? Sim, sou sim!
                    _ Não! – disse pesaroso – Só arrisquei porque vi suas roupas. Você é bem estiloso, e essa roupa é cara!
                    Thiago desanimou.
                    _ Como você quer que eu me lembre de você se nem me disse seu nome?
                    O rapaz se aproximou do botão e o apertou.
                    _ Não sei se vai fazer diferença.
                    _ Claro que vai. – o encarou – Ou você não quer que eu o saiba? Você é meu amigo?
                    _ Você se lembra do que aconteceu para você chegar aqui?
                    Daniel fez um esforço, seus olhos fixaram-se num canto da parede e uma luz lhe acendeu parte da memória.
                    _ Lembro de... Um carro azul. É o meu carro. Eu estava dirigindo, quando achei por bem pôr um cd para ir escutando, quando alguém atravessou a avenida e apertei o freio, mas não funcionou, então fui desviar e... Não me lembro mais.
                    _ Para onde você estava indo?
                    _ Eu não sei... Só sei que...
                    A porta se abriu. Era uma enfermeira.
                    _ Olha ele acordou! Ainda bem mocinho que você acordou já estávamos ficando preocupados.
                    _ Vou ligar para tia. – disse Thiago saindo do quarto.
                    Daniel o olhou sair, quando a enfermeira começou a fazer um monte de perguntas.
                    Todos os parentes possíveis já estavam no corredor para ver Daniel.
                    _ Eu sabia que sua presença aqui, meu filho, ajudaria na recuperação dele.
                    _ Fico feliz por isso, minha tia! Espero que a memória dele se recupere o mais rápido possível.
                    _ Pode ficar tranquilo! O médico disse que após um trauma assim é previsível uma perda de memória parcial. Estamos confiantes.
                    _ Preciso ir agora.
                    _ Mas já? Ele acabou de acordar... Você já conversou com ele?
                    _ Sim! – olhou para o chão – Ele não conseguiu me reconhecer...
                    Tereza sabia que seria difícil para o melhor amigo do filho se não fosse reconhecido, seria para qualquer um. Tentou consolá-lo.
                    _ Não se preocupe. Ele vai lembrar. – disse Tereza pondo a mão sobre o ombro dele.
                    _ Espero que sim! Não o force a nada. – deu uma pausa - Tchau, minha tia! Qualquer coisa me liga, ok?
                    _ Pode deixar. Creio que voltaremos para Pedra Branca em alguns dias, ficaremos aqui na casa do pessoal, e assim que partirmos te aviso, mas vá lá nos visitar. Acho que tenho o endereço aqui.
                    Meteu a mão na bolsa e leu alguns papéis dobrados, separando um azul.
                    _ Eu anotei para... Sei lá para que foi... – entregando-o.
                    _ Obrigado, irei sim!
                    Depois de se despedirem, Tereza entrou mais uma vez no quarto que estava repleto de flores e alguns parentes. Daniel havia se lembrado da mãe e fazia esforço para se lembrar de outros que estavam ali. Ele a viu entrar sozinha.
                    Para onde havia ido o rapaz? Ele nem me falou o nome dele. Daniel olhava vagamente para a porta, como se alguém fosse entrar a qualquer momento.
                    Thiago entrou no carro sem saber o que pensar.
                    _ Ele perdeu a memória! Nem me conhece mais... Como pode? – se perguntava antes de dar a partida. Falar isso doía.
                    Ela não sabia o porquê que ainda doía, mas alguma coisa dentro dele queria ver os olhos do amigo cheios de lembrança dele.
                    Chegou em casa, viu o Guillermo sentado em frente ao computador pesquisando tendências, então se jogou no sofá. Exausto. Não tinha dormido e não conseguiria depois de saber que agora não era ninguém.
                    _ Como ele está? – Guillermo aproximou-se curioso.
                    _ Bem, acordou. Não tem nada demais.
                    _ Isso não é cara de que acabou de ver um amigo sair do coma.
                    _ Só...
                    _ Só? – sentando-se ao lado no sofá.
                    _ Amnésia. – engasgou, enquanto o produtor pôs a mão na boca em sinal de espanto – Não se lembra de...
                    _ Nada?
                    _ De mim! Não se lembra de mim.
                    O silêncio parecia frequente na vida de Thiago.
                    _ Sabe... – disse o modelo – Quando eu vim morar aqui definitivamente. Ele me fez uma surpresa na estação de trem da minha cidade. Pediu para eu ficar. Ele pôs uma música que eu amo, mas agora soa tão irônica...
                    _ Qual?
                    _ Don’t you remember.
                    _ Uau!
                    Ele estava me perguntando isso, mas hoje, sou eu quem pergunta.
                    _ Eu pensei que...
                    _ A Júlia? Sim! Eu a amo também. Eu não me entendo mais. – coçou a cabeça – Se amar uma pessoas é complicado, imagine duas.
                    _ Não há quem você goste mais?
                    _ Meu amigo, não! Não consigo ver diferença. São momentos diferentes.
                    _ Acho que você está bem encrencado.
                    Thiago sorriu desanimado.
                    _ Mas acho que posso saber quem você gosta mais...
                    _ Como, como assim?
                    _ Com quem você se vê no futuro?
                    A pergunta pegou Thiago de surpresa. Foi algo que ele havia pensado e já havia sonhado. Na Bahia.
                    _ Na viagem que fizemos, sonhei comigo e com a Júlia. Estávamos sentados em cadeiras à beira-mar. Minha mão estava enrugada, e me movia mais lentamente. Então, uma mão pousou sobre a minha. – se perdeu na lembrança – Era outra mão enrugada que apertou levemente a minha, olhei para o lado. Era ela. Não vi o rosto todo, mas sei que é ela. Os olhos eram os mesmo. Então acordei.
                    Guillermo estava com os olhos molhados.
                    _ Está chorando, é?
                    _ Você falou diferente. Seus olhos brilharam.
                    _ Não sei...
                    _ Acho que você tem uma resposta.
                    _ Será?

Continua...
© Copyright Mailan Silveira 2011.Todos os direitos reservados.

Nenhum comentário: